domingo, 25 de maio de 2014

Um meio jogo?

Possivelmente, dentro dos larps no brasil possa se considerar que uma coisa não foi ainda considerada totalmente: A grande responsabilidade dos jogadores.

E talvez algo que venho ouvindo, o tropical noir.



Antes da ir para o evento eu fiz duas coisas. Um aquecimento sozinho para encontrar a chave de representação do meu personagem. Para tal eu fiz um exercício com um trabalho de um som que refletia uma plasticidade interessante.

O meu personagem era um andróide, mais especialmente um mordomo. Assim considerei que um tema metálico e plástico, um música com essa percepção seria interessante.

Essa foi a música selecionada:
https://www.youtube.com/watch?v=JKH2VThV_00

Eu coloquei por cima um processo:

Sentir o metal, preso rígido,pesado, com muita pressão. Muita pressão(repeti várias vezes). O eco do som vindo através do corpo, soltando lentamente, lentamente. O eco que passa pelo corpo, e deixa as fissuras se acomodarem, o corpo lentamente achar o espaço desejado.

O corpo se move, é retirado, alguem lhe tira, o eco muito forte, retiram a força seu corpo da terra. Te manejam, batem e transformam. Começe a levantar com espasmos partes do corpo, não tenha controle total do corpo.

Agora vocês tem a possibilidade de começam a sentir tudo duro. Sinta alguém lhe observando, fique ereto. E observe, curiso, toque. (repetindo). Ande travado e ereto, saia, toque nos objetos e olhe.

Essa foi mais ou menos a minha tentativa de achar a chave, maioria dos detalhes vinham no momento, a identidade vinha especialmente da performance. Maioria das referências para mim vinham de seriados, onde por exemplo o jogador deixava o rosto vazio e tentava se expressar pelos olhos e rotação da cabeça. O trabalho com as mãos, o corpo, a postura e como rotacionar o tronco e as pernas. Eu posso não ter me mantido muito fiel durante o jogo, mas tentei manter a chave principal do jogo.

O trabalho com o figurino foi minimalista, nada extra ou que não estivesse fora de uma simples que não caracterizasse um mordomo. Aproveitei para passar no figurino as chaves que não coloquei na representação, amor, sexualidade andrógina e paixão.



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O jogo teve uma produção de cenário interessante, característica da produção da Confraria. O conceito do jogo era interessante, ele predia as pessoas numa armadilha, respondendo e seguindo um fluxo de renovação e morte para controlar a população. Não importa o final, assim como o Godoy acabou implicando subjetivamente, por que a memória é apagada, e a sensação é colocada. O ciclo possibilita que fique fresca a sociedade, mesmo que eles sempre repitam o processo. E é por causa disso que os diretores tinha uma arma, por que eles deveriam se proteger quando o protocolo 7 fosse ativado e até as pessoas tiverem sua mente apagada.

Pelo menos é essa a leitura que se foi feita por mim. O mundo era uma prisão



Uma outra coisa interessante é a da relação organizadores e jogadores. Os jogadores se defendem da sua parte e apenas falam que jogam, mas não. Os jogadores são a parte principal do jogo, e o jogo irá depender deles. É responsabilidade deles compreenderem a proposta do jogo. Uma coisa é ser complicado o jogo, outra é ficar disputando através da competição entre os membros da comunidade. Ficar chateado por que o jogo não foi na direção desejada, é imaturidade, a função não é ir a favor do desejado, mas através do acontecimento.

E é o acontecimento a parte mais importante do jogo. Por que é através da performance e representação que as pessoas dialogam no jogo, vontades se expressam através dessa forma, e a única solução possível é a de responsabilidade. Maioria dos grupos de live ou larp no brasil não preparam os jogadores, não dão workshops, eles providenciam a premissa e o ambiente de jogo com suas regras. O level design é importante, mas em um larp, apesar de ser tátil e um personagem importante para o andamento do jogo, ele não é tudo. A temática é importante, mas ela é apenas a premissa para o jogo.


As pessoas jogam, mas em um larp elas tem tanto controle que o jogo pode ser considerado, como a obra delas. Em uma performance, a obra é criada pelos performers. E um jogo é uma performace se visto que as pessoas jogam, mas participam criando a sensação do jogo uma para a outra, o jogo pode ser mais, pode ser melhor, criando uma experiência diferente e realmente inovadora. O larp não um jogo que só lida com premissa ou com o espaço, mas com a participação, como participar, como jogar. As pessoas tem de preencher essa parte quando não lhes é dado a preparação e principalmente quando elas sabem o papel e tem uma noção do tipo de representação possível.




Arte necessita de uma segunda pessoa. No larp, o jogo é escrito, e a segunda pessoa vai puxar pra uma direção desejada. Agora é responsabilidade de todos o que o jogo se torna, e aceitar o que se tornou.

Larp não é um jogo competitivo, não existe ganhar, mas experienciar. A mentalidade de competição não funciona. O larp toma sua forma verdadeira quando as pessoas se esforçam além do figurino, e se preparam de verdade e ficam por fora de paradigmas, mas enquanto as pessoas ainda ficarem presas em todos os sentidos e não se soltarem, o jogo irá ficar muito enfraquecido.

Mas maioria das pessoas não sabem da responsabilidade, está na hora de falar para eles sobre a chave, lhes ensinar, e mostrar para aqueles que a performance deles talvez possa ser melhor, e assim o jogo possa ser mais do que um apenas uma narrativa, uma mecânica e um cenário. Larp e jogos são arte, e arte é experiência, é emoções, é uma resignificação do mundo.

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Larp é uma das linguagens de arte, criada pelos participantes, assim como as performances, uma grande responsabilidade, mas podemos afirmar que tem vários tipos de níveis de interesses dos jogadores, algumas pessoas querem investir muito na experiência, outras querem apenas jogar. Quem sabe seja de interesse evidenciar para os jogadores que eles mesmo não fazem o correto, e deveriam fazer um trabalho diferente, e talvez seja o caso das pessoas não saberem como fazer esse trabalho, e por causa disso talvez seja interessante mandar uma proposta de aquecimento em som, ou vídeo criado pelo grupo para as pessoas junto com as fichas de personagem. Ou uma proposta em escrita de como ela deve ser feita.

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Assim como sempre, a produção do cenário foi impecável. Foi feito um trabalho com tendas, panos, projetores, luzes, música e vários objetos táteis.

Protocolo 7 simulava a vida de moradores em uma Unidade. Ela era basicamente uma pequena vila, isolada do mundo, que tinha leis e regras ambiguas forçada sobre os seus moradores. Havia uma simulação de rotinas, trabalhadores cortavam papéis com tesouras e as colavam posteriormente, tinha uma cadeia de produção. Os médicos cuidavam dos doentes e enfermos, que eram muitos, e cuidavam de negociar transplantes.


Além disso, as pessoas ganhavam pastilhas nutricionais durante o jogo como se fingissem que fossem seu alimento, e deveriam consumi-las a cada ciclo considerado como dia. E além disso, havia a escola, onde as crianças aprendiam, e uma classe de supervisores que garantiam a funcionalidade do lugar.



Havia tambêm um drama familiar, que possivelmente era um dos focos do problema. Como um filho que era na verdade "adotivo", ou um filho que tinha problema de coração e não tinha dinheiro para o remédio, um pai que iria morrer, uma pessoa perdida, alguém que precisava de um transplante. Eram vários os exemplos, ali estava dramas familiares, plots que tomavam sua maior forma no ambiente familiar, nas casas depois do trabalho, a tendencia nova dos jogos da confraria, eu até veria esse jogo melhor com uma roupagem de 1980, uma tirada no fim da ditadura. É isso o que falo, temática é roupagem, superficial, mas aqui, a roupagem visava prender ainda mais.




O jogo em si foi bem preparado, drama, suspense e policiamento.
Havia duas partes, essa, mais sufocante, um pouco gritante, lenta, onde as pessoas batalhavam para conseguir tentar burlar o sistema.



Havia uma equipe que gravava entrevistas e mostrava aos operários.



Isso era uma proposta interessante de uso de tecnologia. Usavam a tecnologia pervasivamente, como um instrumento de mídia. Eles eram jogadores que entrevistavam as pessoas

Faziam parte do jogo, e tinham seus vídeos mostrados para as pessoas que trabalhavam na fábrica. Foi uma abordagem interessante, onde as pessoas usavam essa mídia como uma ferramenta. O meu personagem não tinha contato com os vídeos. Mas para a experiência dos outros jogadores, talvez tenha sido diferente, como um ferramenta de propaganda e ruído para fazer o trabalho passar mais rápido. Houve dois episódios antes, cada um mostravam episódios de como as pessoas deveriam viver, eram simples e continham entrevistas a pessoas, eram um simulacro de programa de tv interessante.




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E a comunidade? Muitos jogadores novos, alguns antigos que formavam um pequeno grupo tinham um interesse curioso no jogo. Eles participaram da maneira interpretativa não realista deles, e se importavam muito em conseguir atingir seus objetivos. Na hora do debate maioria deles acabaram saíndo, independente da razão. Mas isso prova como o jogo funciona em núcleos sociais. Talvez eles tenham uma facilidade melhor de se relacionar durante o jogo, procuram um ao outro mais rapidamente do que o estranho com quem não tem sintonia.

Independente, no final acabaram se isolando dos outros jogadores, talvez não conscientemente os grupos atuem como um indivíduo. Quem impõe e controla a direção do jogo.
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Agora a gente vai misturar deus( loucura pra frente, pode pular se preferir)

No jogo, faltou algum representativo religioso, talvez isso fosse o protocolo, mas isso pode ser simulado. Em crianças, ou indivíduos que acabam de chegar, a pessoa tende a racionalizar e perguntar. Assim que ele cria uma metodologia de racionalização e paradigmática, a pessoa concretiza a forma de relacionamento com o mundo. Nós somos racionais, e atribuímos e procuramos significados.

Uma parte importante da nossa mente, talvez seja de perceber o nosso reflexo, identidade e limite, e estipular o que a outra pessoa pensa. Isso é facilitado quando pessoas convivem e entram mais facilmente em sincronia ( o que é forçado com a espera das pessoas para começar o jogo, ou a casa dentro do jogo).

Aí vem a religião. Ela possibilita as pessoas a criarem auto controle, por causa da vontade que a pessoa tem. Mutável como ela é no decorrer, o modo como ela racionaliza, o paradigma por trás da pessoa cria uma chave que afeta seus outros atos. A "religião" aqui é mais a visão do grupo sobre fatos que devem racionalizar, e o quão ela muda o comportamento de individual para grupo. Nós somos uma animal de grupo, vivendo em uma economia que valoriza o indivíduo, e é no grupo que tomamos a forma e viramos todos uma só identidade, mudando para virar parte igual à maioria.

E sim, hipsters são hipsters, por causa de se assemelharem aos outros hipsters. Escolher ir para um lado, expulsar alguém ou vestir azul, é uma questão de similaridade e identidade. A maioria e o grupo surgem dependendo do ambiente, meio que emergindo do meio e das vontades por trás.




As pessoas buscam filiação, e assim como a religião não providencia o tipo de filiação próxima que antes talvez possibilitasse, agora as pessoas providenciam caminhos diferentes. E todos somos parte de um grupo, seja lá qual seja ele e seu paradigma. E a relação com o larp, é que talvez, ele seja um algutinador, por criar uma experiência passada pelo grupo.
Quem sabe, essa experiência um dia seja espiritual?
Afinal, deus pode ser sentido de qualquer forma.

Mas eu sou um ignorante, melhor esquecer talvez. Ainda preciso estudar mais.

E voltando para um outro assunto, pessoas que burlam levemente as regras para facilitar o jogo, fazem por uma razão, ganhar. E isso vêm dessa vontade da experiência, de ganhar, a falta de auto controle, que se renova e é gasta com o tempo até precisar ser preenchida novamente. E todo sistema lógico pode ser quebrado por um paradigma, só depende de quando e da mentalidade de quem quebrar, e depois o escritor tem de averiguar, e aceitar, que se deve adaptar.



Esqueçam o que falei, se estou errado, simplesmente ignorem. E há coisas que não podemos explicar, mas outras podemos estudar :/

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E havia o tal do tropical noir. Mas a final, o que é isso?





A antropofagia da estética talvez seja na plasticidade da luz, a estética do som, o grito da repropriação de sentido do espaço. Itten falou que a pintura, é plástica e rítmica





E experiências semi religiosas fazem grande parte do tropical noir



Mas a coisa principal, é a de transformar a experiência do jogo em um simulacro de algo mais. Essa instalação foi lúdia através da música, e performativa através de atores nus que dançavam no meio dessa semi-esfera. A experiência nesse caso foi guiada pela música, pelo ambiente, pela semi religiosidade, pelo ambiente, pela textura e tátil do chão, a composição de tudo. Foi guiada pelos performers, e principalmente por uma coisa, psicotrópicos. Há muitos jogos que usam álcool, mas poucos que usam drogas realmente psicotrópicas além de rituais, talvez possamos um dia testar, assim como esse evento foi um deles.


É a possibilidade da experiência espiritual que as pessoas criam significado do mundo. E se jogos participativos são como huizinga fala, derivantes de rituais, talvez possamos inserir em jogos participativos e representativos elementos semelhantes. Uma coisa importante é a criação da mentalidade através do plástico. O conceito não é uma palavra ou conjunto delas, mas algo plástico e ideal transmitido que através da multifacetação é reinterpretado pela pessoa. Por mesmo que idealizado, o criado propõe uma visão, mas a obra é multidimensional, multiexperiencial, criada pela perspectiva do indivíduo, e quando em grupo, pelo demoninador comum da experiência, e pelo vocabulário coletivo experiencial.



A melhor parte de tudo, é que o artista para criar uma experiência significante, tem de experimentar sentir quais são os ícones significantes na mente das pessoas. Afinal, ele não existe em um vácuo, mas em um meio, e para conseguir o significado desejado, ele tem de entender como as pessoas sentem e respondem a suas peças.


O lúdico, é como uma instalação, ela cria possibilidades de resignificação. E jogos possibilitam isso através da brincadeira. Teorizou-se muito sobre jogos, e no final, conclui-se que se apenas se joga. Logo a possibilidade de transformar não precisa de um paradigma ou razão, ela apenas existe. O jogo participativo pode ficar no meio disso tudo, quando falamos que o jogo pode trabalhar como essência possível da obra, a relação pessoa espaço, a relação interpessoais, como uma instalação lúdica que força as pessoas a retrabalharem e aceitarem posições e perspectivas novas.


No mundo virtual do jogo, a forma de interação com o exterior e outrem é a mesma maneira como se estabelece hierarquias dentro do jogo, identidades e relações. Onde só há música, os instrumentos são os que falam mais alto, especialmente quando as pessoas perdem suas feições, o posicionamento da importância delas diminuindo e suas experiências falando mais.



A possibilidade estética no larp é grande. Mas grupos tendem a trabalhar sempre minimalisticamente ou sem estética, eu mesmo não trabalho com a parte estética, por que não sei como, não sou um artista plástico, falta pessoas qualificadas para fazer o trabalho estético e é provavelmente quando tivermos que poderemos fazer experiências mais memoráveis e fora dos padrões e paradigmas que sempre são realizados. E o larp pode ser a melhor forma, por possibilitar as pessoas a resignificarem os objetos e o ambiente.

Eu não respondi o que é tropical noir, mas respondi o que é arte lúdica(meio)

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Bem, até alguma próxima postagem, mas até lá eu irei continuar realizando experimentos com essa linguagem, e você?

E como mostragem do que está acontecendo, coloquei aqui uma informação: eu não trabalho com a parte estética do jogo, mas tento lidar como as pessoas se relacionam entre si e através de objetos. Irei procurar algum artista plástico para me ajudar a planejar o larp tambêm como uma instalação performativa.

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