quarta-feira, 26 de março de 2014

Uma Confraria no Agreste

Eu conhecia um colega, que falava que é na falta de algo, que o ser humano tendi a ser o mais criativo possível. E dentro das limitações do espaço e das possíveis dinâmicas havia um jogo, que manipulou bem essa linguagem, e possivelmente se tornou um bom experimento com a linguagem do Larp.

A exposição Grimm Agreste visava trazer as similaridades dos contos dos irmãos Grimm para a proximidade de cordéis e contos vindos do sertão nordestino.



A minha única memória da terra, é da minha falecida avó Iba, sinto muita saudades daqueles lugares, mas sei que as doces memórias de infância que mal tenho acesso na minha mente lá vão permanecer por muito tempo.


Outra memória que tenho, são os contos do meu pai sobre o passado dele, sua infância, infortúnios, sua jornada para fora do sertão. A amazônia, e seu caminho ao Rio. Meu pai me contou quase toda a vida dele, contos que ele ouvia, filmes que ele assistia sem pagar, histórias conturbadas sobre assassinos e contrivações políticas, a vida de suas irmãs e irmãos, o sofrimento e felicidade. Suas partidas de futebol e seu início na faculdade de medicina. O nordeste é isso pra mim, a minha infância perdida na minha memória, a minha avó Iba, sorridente em fotos, provavelmente alegre. Prato de macarrão, frango e farofa, muito comida, nada pra fazer, parentes em muita quantidade, e eu pequeno e criança. Solto e leve para nada fazer.
A única lembrança que tenho são das minhas tias, eram pessoas adoráveis, que tristemente não sei mais o que aconteceu com elas. Mas eu não vou pra lá por causa de uma razão, aquele é um lugar que não tem mais a mesma mágica. Minha vó estava acamada na última vez que vi ela, agora nunca mais posso a ver. Isso é triste, sinto falta de meus vôs, ela era a única viva quando eu tinha nascido, mas agora se foi. E quando voltei pro Nordeste, não havia a mesma mágica, eu gostava das pessoas, mas eu sentia falta da minha avó. Acho que foi nessa parte da minha vida, que viajar perdeu um pouco do gosto, ou foi a primeira vez que alguem querido pra mim, morreu.



Quando eu cheguei, estava um pouco deprimido, mas o espaço era lúdico na sua natureza. Era um lugar divertido, não era uma exposição convencional, ela trabalhava com várias formas de interatividade.

A primeira parede era uma forma hipertextual que eram relacionadas a uma gama de contos retirados dos Grimm, cada caixa tinha um numero que correspondia a um conto.


A outra parte eram caixas que apresentavam projeções e em baixo haviam um confortável recanto de lazer e leitura com uma inovativa e variada biblioteca de contos para fomentar a leitura, junto com monitores que interagiam e brincavam com os adultos e crianças.


Outra parte interessante era que eles tentavam trazer o cenário dos Grimm para o Agreste. Como uma floresta encantada, passando do território do nordeste, distante do povo, e de seus objetos, o mar que contava a história de Grimm, e do povo nordestino.

A outra parte era um castelo, mágico com suas nuvens e estrelas, distante e recheado com uma tipografia medieval. Dois mundos diferentes mas semelhantes, talvez vindos à tona.


O nordeste é um lugar rico em histórias e contos, como todo povo.


Havia uma maquina que havia sido baseada no trabalho de Vladimir Propp, ele tinha feito um trabalho sobre a estrutura narrativa e chegou a fazer uma pesquisa, que não li. E como essa maquina é baseada, o fato de as pessoas juntarem os elementos selecionados ao acaso.
http://en.wikipedia.org/wiki/Vladimir_Propp


E há uma porta, que na minha visão representava o mistério, os segredos e as chaves erradas para um caminho diferente, todas as variadas fechaduras e um caminho certo.


Mas não vim aqui falar da minha experiência com a exposição, mas com o jogo. E sendo um pouco franco, gosto de exposições de vários artistas, aqui foi uma obra só, o espaço, que já mesmo assim foi muito bem feito.


O jogo foi realizado duas vezes, no dia 22 e 23. Cada um com jogadores diferentes, mas era o mesmo espaço e personagens. Acho que provavelmente a realização foi semelhante, mas vamos a meus comentários.


Primeiro como para mim, o jogo tinha muito mais de Grimm e mágico e aventuras do que o verdadeiro sertão, Vidas Secas, minha avó Iba, e as injustiças de um povo injusto, não entrei na narrativa ou no drama, mas na dinâmica do jogo.

Mas antes de entrar no jogo, vamos falar de Stanley Parable
http://www.errantsignal.com/blog/?p=595

Stanley Parable não é um jogo com uma condição de vitória, a única forma em que o jogador realmente ganha do sistema é quando ele fecha o jogo. Simplesmente pelo fato de o jogo em si ser uma critica de o jogador ser uma pessoa presa em uma narrativa que o narrador deseja contar, e independente de suas ações sempre vai cair em algo previsto pelos narradores. Quando não há liberdade, morrer se torna insignificante quando não há o que ser feito, apenas o que ser seguido. O texto em ingles fala de vários pontos do jogo, várias criticas e como ele força o jogador a jogar a experiência repetidas vezes para que ele compreenda que cada caminho tem a mesma importância, a interação entre os dois (narrador e jogador) não é dinâmica.



Já um jogo participativo como um Larp, tem uma coisa importante, a potencialidade de interações é definida apenas pelo repertório do jogador, assim provavelmente cada jogo teve uma dinâmica diferente. A possibilidade de interação com os outros jogadores funcionava para criar o dinamismo mais importante, o sistema em si. Um jogo é nada mais do que um conjunto de regras e um círculo mágico delimitado por algumas regras. Já em jogos digitais, ele é um sistema que recebe os inputs do jogador e responde conforme a tarefa ou desafio no momento. O conjunto de regras é sempre dado pelo sistema, e como em um larp, não há um sistema para reagir, mas um grupo de jogadores.



Quando nós fomos introduzidos ao espaço, havia 4 tipos de jogadores. Os transeuntes que viam o Larp como uma apresentação ou arte parte da exposição, logo eles viam o que aconteciam e tentavam usar os elmentos que absorviam para criar uma narrativa. Os funcionários da Confraria que haviam criado o jogo e estavam lá para facilitar o andamento do jogo caso os jogadores o chamassem a atenção e estivessem precisando de uma guinada para serem ajudados. Os funcionários do Sesc, que sabiam o que estava acontecendo e preferiam não interagir com a obra de um outro Grupo. E por fim os jogadores.



Talvez a parte mais importante seja transeuntes. Não só porque criancinhas me ajudaram a achar pistas do que eu procurava, mas por que elas mesmas queriam entrar no jogo, e assim que abordadas e ao ouvirem as histórias, e perceberem a forma de jogo existente, elas se desprendem e tentam participar. Possivelmente esse seja o maior publico sem contenções para não querer entrar em jogos em brincadeiras.

A parte mais importante para um jogador, é perceber que não há condições de vitória, todos os finais são válidos. Mesmo que não exista um verdadeiro final, jogadores podem ficar mais felizes com um final que lhes forneça um espectro do que buscam.



"Uma forma de agência independente da estrutura de jogo, mas característica dos ambientes digitais é a navegação espacial. A habilidade de se locomover por paisagens virtuais pode ser prazerosa em si mesma, independenteme do conteúdo dos espaços." (Janet Muray, Hamlet no Holodeck)



O espaço havia sido dividido por um mar, este necessitava de uma interessante mecânica para ser atravessado, a pessoa que embarcava junto com o pescador precisava relacionar os itens das paredes contando uma história, caso falhasse ele afogava. As histórias inicialmente pareciam complicadas e difíceis, mas assim que o jogador se aventurava ele percebia que não era necessário um rigor ou questão que devia ser respeitada. Era uma mecânica que visava apenas acelerar o parlatório do jogador, e o pescador era mais o ouvinte o suposto mensageiro entre as duas partes. Era até que metafórico.



"O labirinto de aventura incorpora uma narrativa clássica de conto de fadas, envolvendo perigo e salvação. Sua duradoura atração, tanto como uma história quanto como um padrão de jogo, advém da fusão entre um problema cognitivo (encontrar o caminho) e um padrão emocional simbólico (enfrentar o que é assustador e desconhecido). As histórias de labirinto celebram a combinação de inteligência com coragem, e retratam o amor romântivo como o elemento reponsável pela esperança que leva o herói para o confronto e que o traz de volta para a segurança. Como em todos os contos de fadas, a aventura de labirinto é uma história de sobrevivência. O labirinto é um mapa esquemático para contar essa história."
"Seja simples ou complexo, um labirinto de aventura é especialmente apropriado para o ambiente digital porque a história está amarrada à navegação do espaço. Conforme avanço, tenho uma sensação de grande poder, de agir significtivamente, que está diretamente relacionada ao prazer que sinto com o desenrolar da história. Em um jogo de aventura essa satisfação assemelha-se à vitória." (Janet Muray, Hamlet no Holodeck)



O mundo estava se desfazendo, e as pessoas precisavam se salvar. Eu mesmo não sabia o que estava acontecendo quando entrei no jogo, tinha saído em um momento e perdido a introdução. Mas acho que a parte mais interessante de um Larp, ao contrário de um jogo digital. É que maioria das pessoas tentam ser fiéis ao personagem, tentando racionalizar como ele, como se fossem um papel e estivessem representando. Essa parte é o quesito mais importante que realiza o dinamismo e fornece com que as pessoas ainda interajam com uma dinâmica e fluência ao jogo. Em jogos a pessoa recebe o papel imposto pelo jogo, e constroi lentamente a sua percepção do que ele deve tentar simular ser. Lentamente através de informações ele é construído, através da interação o jogador descobre seu papel e responde a ele.




Muitas vezes jogadores acabam achando similaridades com o personagem, e se colocando nele. Cada jogador tem um repertório ou interesses próprios. Eu não joguei de acordo com o personagem que me foi dado, não consegui me colocar e fazer um preparo para entrar no personagem. E por isso comecei a andar em uma velocidade mais acelerada do que o ritmo do personagem, eu via ele como uma pessoa autoritária e paciente. Vejo a visão de tempo daquele povo como algo diferente, mas diferente do que foi observado no jogo, uma pressa, uma agitação, um outro ritmo. Para entrar no personagem, eu não preciso entender, mas sentir, talvez o filme Vidas Secas umas 3 vezes seria suficiente para entrar no personagem, mas de acordo com as necessidades do momento implementei práticas rotineiras da minha visão e coloquei elementos que julguei não serem os melhores para a minha imersão como personagem, mas coloquei um personagem mais perto das minhas experiências e do que esperava do jogo no momento.



Jesper Juul trata em seu livro Half Real por Degenerate Strategies:

“Degenerate strategies often appear in complex games, where the numerous permutations of play sometimes afford shortcuts in the space of possibility. For example, you are playing a real-time strategy game against the computer and you realize that the program's AI does not handle pathfinding well. (Pathfinding refers to the aspects of the program that plot navigational paths for the computer-controlled characters through obstacle-filled terrain.) Whenever the computer-controlled troops move around obstacles, they begin the march in formation but end up disorganized, with individual units trapped in irregularly shaped pockets of the terrain. It is not difficult for you, however, to make the small corrections necessary to keep your units together. If you decided to take advantage of this weakness by strategically leading the computer-controlled opponents into obstacle-filled parts of the map, you would be using a degenerate strategy. “ (Jesper Juul)

Onde teoricamente, um jogador vai fazer uma racionalização do meio, perceber padrões e tentar burlar ou cortar caminhos para facilitar sua interação. Como Larp é complexo pela interação, vejo que jogadores tendem a compreender como os jogadores jogam, e a usar o espírito de bom jogador. Ou melhor, acordos nas frases do Luiz Prado. Schell já considera essas regras em si como regras comportamentais. Vejo que elas são o cerne do Larp, e derivam do grupo e qual direcionamento ele parece estar tomando, somente em alguns casos, eles são quebradas, e muitos casos para direcionar o jogo, e introduzir uma nova regra. Assim que uma regra acaba sendo quebrada muitas vezes pela comunidade, jogadores param a ver a regra como regra, e mais como uma antiga forma de percepção, é por causa disso que maioria dos jogadores tem a percepção de serem autores. Pois através da experimentação, o grupo inconscientemente irá usar, descartar ou incorporar regras, essa forma faz com que o jogo do grupo realmente tome caminhos diferentes, enquanto um outro grupo, ou de pessoas inexperientes com a forma tendem a cair em caminhos que lhes façam questionar se devem ou não continuar no jogo. A familiaridade com o jogo é o conjunto de regras, já que é um jogo com interação entre pessoas, e a única coisa de difenrete a uma situação social, é a máscara do personagem, a proposta do jogo e as mecânicas que visão direcionar o jogo.

Como essa forma é totalmente social, pessoas com propostas diferentes de jogo. Tendem a passar essa capacidade de jogo para outras pessoas através da imitação, mas já como a forma é totalmente dependende da troca de informação através da conversa, que é uma forma rudimentar, o jogo se torna mais lento e parado.




O que é Larp, do que uma forma nova de Arte?

“A noção de um meio procedimental que proporcione o mesmo tipo de satisfação advinda da arte é algo com que ainda temos de nos acostumar. Precisaremos de tempo para nos habituar a combinar participação com imersão, agência com história, e a perceber os padrões num mundo ficcional caleidoscópico. Acima de tudo, o meio procedimental desafiará nossos conceitos de autoria. Dentro do modelo impresso, concebemos um ambiente autoral como algo definitivo, velado a variações. Um mundo mutável e caleidoscópico pode parecer a alguns como um mundo sem autoria.” (Janet Muhray)

Acho que já falei da maioria dos assuntos interessantes, poderia falar da construção da ficha de personagens. Eu poderia falar de como o trabalho com o espaço foi maravilhoso, e o uso da diegese foi bem feito, especialmente não só dentro da proposta da oficina. Depois volto pro Level. “One plays only if and when one wishes to. In this sense, play is free activity. It is also uncertain activity. Doubt must remain, until the end, and hinges upon  the denouncement. In a card game, when the outcome is no longer doubt, play stops and the players lay down their hands. In a lottery or in roulette, money is placed on a number which may or may not win. In a sports contests, the powers of the contest, the powers of the contestants must be equated, so that each may have a chance until the end. Every game skill, by definition, involves the risk of the player missing his stroke, and the threat of defeat, withouth which the game would no longer be pleasing . In fact, the game is no longer pleasing to one who, because he is too well trained or skillful, wins effortlessly and infallibly,” (Roger Caillois)



A maior proposta de um Larp, é lidar com estados de informação. Alguém sabe de algo, toda informação é possivelmente veridica, ou não. Considerar que tudo seja verdade é uma possibilidade de jogo, mas não trata de uma forma verídica o lado da emergência hierárquica dentro do jogo(   parte 2    ). Eu vejo o jogo da confraria como um grande texto onde jogadores fazem bleed in, ele depende dos jogadores e sabe exatamente disso, por colocar jogadores mais novatos em posições que acompanhem jogadores mais dramáticos ou capazes da mostrar formas de jogo e interagir com várias pessoas e mostrar várias práticas de jogo.

Maioria dos larps tratam de transmitir informações, e segredos é o que maioria das pessoas procuram fazer. Como fazer tal ato, ou quem é o inimigo. Ações são simples, já que o larp trata de uma narrativa mais dramática

Caillois trata Imitação, como uma das partes mais importantes do jogo. Jogadores aprendem por imitar, gravar situações nas memórias e simular dentro delas comportamentos que julguem pertinentes, pessoas trazendo o repertório para o jogo ao tentar se comportar como um personagem retirado de seu vocabulário na mente. A interação trata justamente que a capacidade do jogador é a que vai delimitar a capacidade e o caminho do jogo, e é dever do jogador tentar trazer expectativas ou possibilidades novas para dentro do jogo e comunidade, ao se tornar visível essa prática, jogadores irão logo imitar ou se referenciar dentro do jogo, criando uma coesão ou padrão de jogo.

“O processo cíclico de constituição, significação e ressiginificação das mensagens exige, como os parangolés de Oiticica, ser tratado como projeto, porém aberto, a favor de novos usos por parte dos receptores. Nessa perspectiva, a aproximação talvez se identifique ainda mais com o conceito de projeto, de Oiticica, “em que o conceito da obra acabada é trocado por estruturas germinativas, nas quais a participação do indivíduo é a sua própria criação, quer ocorra de forma direta, quer por meio de sua imaginação” (Oiticica apud Justino, ibid, p. 104). A função dos mecanismos interativos passa a ser a desibinição dos repertórios individuais para, como eles, formar um caldo comunicacional heterogêneo, metamorfoseando os receptores em produtores inventivos.” ( Fabrizio Poltronieri, Mapa do jogo)

Eu ainda não falei das pessoas fora do jogo, mas não tenho vocabulário para isso. Simplesmente entenda que as pessoas passam a ver a arte passivamente, e é de acordo com os preconceitos, estigmas ou interesses da pessoa, que evita ela ou não de seguir um jogador, prestar atenção ao que acontece, a interagir e tentar ajudar. Sendo a expectativa e mentalidade do espectador a coisa mais importante, arte participativa tem de ser ainda dialogada em Larps, e a Confraria das Idéias parece estar indo a caminhos próximos.





quinta-feira, 13 de março de 2014

Oficina Larp

Vou ministrar uma oficina junto com alguns colegas no ateliê compartilhado, casa amarela.
E estou fazendo uns testes de logo, vou fazer algo mais em conta com a experiência da casa.

O grupo se chama oficina LARP, e provavelmente vai começar a realizar outras atividades em outros espaços com a mesma proposta, divulgação e criação de publico e autores.







sábado, 8 de março de 2014

Arte em jogos, minha visão

O que é um livro, ou uma peça? Um objeto, esperando para ser devorado por uma ou mais pessoas, consumidos, e experiênciados.

Quando você lê, você não só consome passivamente, você pensa, imagina, você reflete, você discute e interage com a obra em um plano mental.

Uma peça já não, é cabo dos atores interpretarem e passarem a experiência da obra ao seu público. Não só isso, como os espectadores da peça devem fazer uso do plano imaginário para entendê-la e refleti-la, é uma habilidade mental inerte em todos, refletir e imaginar, construindo por trás na nossa a nossa compreensão da trama enquanto ela está sendo formada na nossa frente.

Mas assim como os espectadores, os atores tem um papel, eles poêm seus repertórios e capacidades para transpor ao público a experiência desejada, cada atuação, pode ser similar, mas sempre vai ser diferente. A definição de arte para os gregos vinha junto com a capacidade lúdica, tanto que eles tinham preconceitos contra esculturas e pinturas, e preferiam ao teatro e dança.

Jogos digitais não caem fora disso, o jogador é uma espécie de interator, ele recebe um papel no jogo, e uma capacidade de jogo, e regras que delimitam sua liberdade dentro do espaço. O jogo antes, era apenas um esqueleto, uma peça, uma premissa que dá espaço e palco ao jogador fazer seu papel seja lá qual for sua intenção com o jogo, tanto que qualquer interação com o ambiente de jogo, é uma espécie de jogo. As pessoas são livres para interagirem da forma desejada, e não da esperada por outros, pois como uma experiência artística, a pessoa deve impor de seu repertório e capacidade para jogar.

Larps e Args são uma outra forma que utiliza ainda mais disso, pois há mais liberdade, maior espaço para interpretar o papel dado ao jogador, menos regras, e um espaço real, onde o que separa ele do mundo é o corpo e sua crença na ficção do jogo. Tanto que na minha visão, mesmo que o desejo do autor seja a de pintar um retrato, ou um quadro, os jogadores(interatores) seriam como cores retiradas de vários baldes, cada um deles vem com um repertório, repleto de defeitos e capacidades, todos únicos, e o autor pode fazer um controle de qual cor irá ter qual papel no quadro.

O larp, ou seja lá a forma de jogo, como produto é o desejo do autor, a premissa, o esqueleto ali disponível, somente se tornando pleno com o preenchimento, com a alma do interator.

segunda-feira, 3 de março de 2014

Duas bandas, um mundo paralelo

http://luizprado.wordpress.com/2014/02/26/fotos-ouca-no-volume-maximo-na-gruta-21022014/

Novamente, teve uma grande realização do Ouça no Volume Máximo. Não tenho muito o que falar, além de que foi uma experiência interessante, dirigida sempre por jogadores com grande repertório e capacidade de representação, tanto que o rumo interessante foi dado graças à habilidade dos jogadores com a linguagem.



“Compartilhar um ambiente de fantasia improvisado com outras pessoas envolve uma negociação constante do enredo e também dos limites entre a ilusão consensual e o mundo real. Quando tudo corre bem, os jogadores podem proporcionar, uns aos outros, uma criação coletiva de crença semelhante ao faz-de-conta compartilhado na infância. Mas quando as coisas vão mal, o jogador fica emperrado numa sequência narrativa confusa, pela falta de consenso ou enão é abandonado e fica sem companhia para jogar.” (Janet H. Murray, 2003, 171) O jogo não teve nenhum problema, correu perfeitamente e em uma grande dinâmica. Houve nada que atrapalhasse o fluxo do jogo. Mesmo que houvesse uma dissonância entre os jogadores, como por exemplo, alguem falar da mulher vadia de Albertinho e Albertinho demorar para processar a informação, com a proposta de criação coletiva, o jogo era criado na mão dos jogadores através da interpretação e criação de informações. O primeiro a assimilar essa informação seria o locutor que iria trazer essa informação à tona no jogo. Essa iria guiar o jogo em determinado momento, tanto que realmente uma grande parte do jogo foi sobre a mulher dos outros, e o saudozismo veio à tona na ironia e tom de deboche.

E também pelo que a bebida trazia, um ambiente mais sério e descontraído. Um fim da semana de trabalho. Cada jogador trazia o jogo para um lugar, e o coletivo traz uma proposta, cada jogador é um pacote de vocabulário, repertórios, emoções e temas. Tanto que talvez seja importante considerar que ter uma mesa de jogadores veteranos, ou uma mesa de novatos, ou uma mesclagem seja interessante. Jogadores veteranos tem preconceitos e paradigmas imbutidos na forma como eles jogam, a forma como as pessoas jogam traz a tona, e influencia na criação da linguagem na mente dos jogadores novos.
Já  falei que houve duas realizações do ouça?



olha a outra lá no fundo.... distante, mas ainda presente no mesmo espaço

O jogo Ouça No Volume Máximo, de Luiz Prado. Possibilita acontecimentos como esse, onde apesar do espaço, há duas arenas de jogo. Ou na visão de Huizinga, um circulo mágico. “The songs themselves are typical play-products with fixed rules, varied repetition of words or phrases, questions and answers.” (Johan Huizinga)

A outra mesa teve uma jogatina diferente devido ao fato de além dos jogadores terem propostas e visões diferentes. O conjunto de regras do jogo possibilita uma mesclagem sempre nova, colocando os jogadores sempre em uma posição diferente. Tanto que muitos jogos participativos (Larp) são emergentes em sua natureza. E a visão de que jogos são limitantes e experiências realizadas apenas uma única vez é um conceito pervertido pela indústria de jogos digitais.
Principalmente onde pessoas têm um tempo livre delimitado, o jogador não tem tempo para passar 5 a 30 horas jogando, mas ele tem 20 minutos a 1 hora em uma sessão de jogo, e esta já tem de estar pronta para trazer a experiência não só proposta pelo jogo, mas a procurada pelo jogador.

“The arena, the card-table, the magic circle, the temple, the stage, the screen, the tennis court, the court of justice, etc., are all in form and function play-grounds, i.e. forbidden spots, isolated, hedged round, hallowed, within which special rules obtain. All are temporary worlds within the ordinary world,. dedicated to the performance of an act apart.” (Johan Huizinga)

Independente se os jogadores soubessem ou não que havia uma outra realização do jogo. As regras delimitavam que só havia uma banda Ouça, ou talvez não, mas foi-se considerado que o jogo somente existia, a existência de um outro círculo mágico mantido por um outro grupo no mesmo ambiente não foi nem colocado em questão pelo fato de ser apenas ruido. Uma conjugação fora do jogo. Então seria possivel afirmar, que no espaço havia dois círculos mágicos? E as regras?

Regras fundamentais - "As regras fundamentais são a estrutura formal subjacente ao jogo."
"Regras fundamentais são uma representação matemática do estado do jogo e como e quando ele muda."



Regras comportamentais - "Essas são as regras implícitas à jogabilidade, que a maioria das pessoas compreende naturalmente como parte do bom "espírito esportivo"."



Na visão de Schell, a comunidade aplica regras dentro do jogo para tentar aprimorar a qualidade do jogo, ou para facilitar o que se deseja obter(xadrez), ou para melhorar a experiência (sinuca).

Uma outra parte importante, foi o trabalho do Prado. "Tentar criar uma "jogabilidade emergente", isto é, ações resultantes interessantes, costuma ser comparado a cultivar um jardim, pois o que emerge tem vida própria, mas , ao mesmo tempo, é frágil e facilmente destruído. Ao perceber algumas ações resultantes interessantes aparecendo no seu jogo, você deve ser capaz de reconhecê-las, e então fazer o que puder para fomentá-las e lhes dar uma chance de florescer. Mas, antes de tudo, o que faz essas coisas brotarem? Não é apenas sorte - há coisas que você pode fazer para aumentar a probabilidade de que essas ações resultantes apareçam. Eis cinco dicas para preparar o terreno do seu jogo e plantar semestes de emergência." (Jesse Schell, 2004)

A variada realização do jogo em várias oportunidades, e mudança constante foi bem interessante. O jogo mesmo foi transmitido verbalmente pelo autor, tanto que ele estava disposto a deixá-los perguntar. Só pelo fato de ser transmitido daquela forma, o autor fazia uma edição de informações ou partes, mesmo que inconsciente das partes para melhorar a progressão e aprendizado das regras e mecânicas do jogo.

Jogos participativos já são emergentes por natureza. E a possibilidade de facilitar ele se tornar na visão dos jogadores sempre inusitado é devido à possibilidade de modificar as ações resultantes sempre, ou devido aos papeis sempre transitórios no grupo, suas opiniões a respeito de certo tema, sua posição hierárquica, as ferramentas disponíveis(habilidades virtuais), o pacote "jogador", e a criação conjunta. "As ações resultantes muitas vezes envolvem interações sutis dentro do jogo, e muitas vezes são movimentos bem estratégicos. Basicamente, essas ações não são parte das regras em si, mas sim ações e estratégias que surgem naturalmente à medida que o jogo é praticado. A maioria dos designers de jogos concorda que  ações emergentes interessantes são a marca de um bom jogo. Consequentemente, a proporção das ações resultantes significativas em relação às ações operacionais é um bom indicador de quanto comportamento emergente seu jogo apresenta. É um jogo realmente apurado que permite  ao jogador realizar um pequeno número de ações operacionais, mas um grande número de ações resultantes. Deve-se observar que esse indicador é mais ou menos subjetivo, uma vez que o número de ações resultantes "significativas" é uma questão de opinião" (Jesse Schell, 2004)


Agora outra coisa, imersão. Palavra feia, vamos para a que Janet propõe em seu livro, crença
“A prazerosa rendião da mente a um mundo imaginário é geralmente descrita, nas palavras de Coleridge, como “a suspensão intencional da descrença” . Mas essa é uma formulação muito passiva, mesmo para os meios de comunicação tradicionais. Quando entramos num mundo ficcional, trazemos mais do que apenas “suspender” uma faculdade crítica; também exercemos uma faculdade criativa. Não suspendemos nossas dúvidas tanto quanto criamos ativamente uma crença. Por Causa de nosso desejo de vivenciar a imersão, concentramos nossa atenção no mundo que nos envolve e usamos nossa inteligência mais para reforçar do que para questionar a veracidade da experiência.”
“Como os teóriocs conhecidos como The “Reader Response” School (Escola da “Resposta do Leitor”, ou da Teoria da Recepção) têm há muito tempo argumentado, a leitura está longe de ser uma atividade passiva: nós construímos narrativas alternativas enquanto lemos, escalamos atores ou pessoas que conhecemos nos papéis dos personagens, representamos as vozes dos personagens em nosssas mentes, ajustamos a ênfase da história para que se encaixe aos nossos interesses e agregamos a história ao esquema cognitivo composto por nossos próprios sistemas de conhecimento e crença. Da mesma forma, quando assistimos a um filme, tomamos os espaços separados dos vários cenários e os fundimos em um espaço contínuo, existente apenas em nossas mentes. Pegamos cenas fragmentadas e completamos mentalmente as ações que estão faltando; se alguém é visto com uma sacola de supermercado e, em seguida trabalhando em um fogão, compreendemos que a refeição é trabalhosa. Se uma pessoa usa um moletom da Ivy League, podemos supor que seja alguém inteligente e determinado ou, talvez, um aluno mimado de um colégio preparatório. Aplicamos nossos próprios modelos cognitivos ou culturais e psicológicos para cada história, enquanto avaliamos os personagens e antecipamos o modo como o enredo tende a se desenvolver.”

Acho que se explica sozinho.


todos os jogadores presentes
O maior perigo de um larp, é ele se tornar um evento onde a comunidade é o maior ponto, isso destrói o jogo e o torna em um espetáculo, débil e mais assistido do que jogado.
Assim como Huizinga afirma, o jogo está em sua forma plena em seu modo arcaico.

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Já falei tudo que podia, agora vou falar do meu jogo, retalhos




O jogo foi realizado no anfiteatro da Casa Amarela, Ateliê Compartilhado
Iniciativa muito interessante, com uma ótima proposta de responsabilidade cultural e incentivo e acolhimento do trabalho de variados artistas independente de sua forma.
https://www.facebook.com/ateliecompartilhado



O jogo correu bem, mas como lidava com jogadores novatos, começou em uma velocidade interessante, e passou para um ritmo mais demorado, até lento. 
Um dos jogadores tinha um repertório limitado e travado, mas foi o único jogador que tinha vindo de uma comunidade de jogadores de rpg, e aquele jogador em especial que não vou citar tem um impacto social muito negativo. Um troll. Larps tambêm tem troll, mesmo que não saibam que são. Troll são criaturas sangue-sugas que procuram atenção, se focando assim em se apegar em comunidades, independente da forma. Eles não vêm pelo produto, mas para conseguir algo que sentem falta, atenção.

Muitos teóricos falam que uma comunidade saudável é feita de variados arquétipos, mas eu acredito que uma comunidade saudável é somente sustentada através da manutenção da comunidade. Como podar uma erva daninha.



Os jogadores foram colocados em movimento, mas de acordo com a proposta de jogo, já havia um número limite de jogadores. Pela perspectiva de jogo, Retalhos é imersivo com um foque leve no drama, onde os personagens se focam em apenas um elemento a partida de Retalhos. Neste jogo, por erro de comunicação da minha parte, todos os jogadores não sabiam que retalhso tinha de ir embora sozinho. E Retalhos por se não se contentar com a despedida de um jogador, se possibilitou em se matar para fugir do fato de abandonar um amigo. Pesado.



Mesmo que o tom tenha sido de uma brincadeira, o conceito por trás foi pesado. Posteriormente passei para o diálogo com os jogadores, e perguntei a eles suas opiniões, e lhes passei a minha visão da cena, e como sempre fiz uma chamada aberta a produtores. Claro que a chamada somente vai ter efeito com pessoas que conhecem o trabalho, tem interesse e contato com o autor, mas é bom enfatizar que estou aberto.

A questão sobre o publico de jogadores, trabalhar com jogadores inusitados é bom, mas nem sempre fruível se um jogador experiente no jogo for influenciar e viciar o jogo deles. Jogadores com impacto social negativo são poucos, muitas vezes o simples fato de sua presença pode modificar o jogo, principalmente quando os jogadores o percebem como tal. O jogador em questão pode parar de ser, se perceber o estigma dele e tentar mudar sua abordagem. Outra possível abordagem é esse jogador não jogar mais, não pelo fato de ele ser irresponsável em sua parte, mas muitos vezes ele vir pela comunidade e não por gostar do jogo. 


domingo, 2 de março de 2014

Retalhos


Realização inusitada do retalhos, consegui abordar e trazer jogadores pra jogarem retalhos. ùnico problema foi um jogador problema que veio atrapalhar, mas o jogo rolou bem apesar da pessoa.
E tem umas fotos da casa amarela, se quiserem dar uma olhada, ótimo espaço ^^

sábado, 1 de março de 2014

Publico e mensagem

Em um jogo participativo como larp, cada jogador traz uma perspectiva e jogadores veteranos puxam o jogo para sua perspectiva. Eu proponho não só captar, mas descaptar jogadores, indicando para eles que esse não é seu jogo. Principalmente quando o jogador veterano, realmente não sabe jogar, e tem um repertório minúsculo. Ou melhor, um péssimo interator que so gosta do que faz e traz muito o jogo pra uma perspectiva.

Design em Larp


Primeira coisa. Muitos dos jogadores já estão acostumados com paradigmas de jogos digitais. Mas não de Larps. Maioria dos jogadores que vem e começam a ser retidos são na maioria jogadores de rpg, que imbuidos de preconceitos paradigmáticos desse ramo, vêem o Larp como se fosse um rpg. Pois já como não há uma percepção de identidade única, as pessoas tem de ser ensinadas paradigmas e visões novas, e possivelmente perder sua visão.

Em um jogo complexo e diferente, pessoas tem de abordar o jogo de alguma forma, possivelmente exploratória, mas para isso ele tem de enteder as mecânicas. Mas caso não haja dialogo entre o jogador e o jogo, ele simplesmente vai desistir.



A melhor forma para se aprender um jogo, é aprendendo suas regras. O resto do aprendizado vai ser baseado na exploração. Jogadores novos devem ser preparados para o jogo, tanto que há variados usos de tutorias em jogos. Tutorial é uma prática rejeitada, mas para jogos que trabalham com algo inusitado, é melhor que isso seja implementado. Como em larps a organização consegue ver quem são os jogadores novos. Essa identificação e abordagem para lhes acolher no jogo, e capacitá-los no jogo é uma prioridade. Jogadores não podem ser deixados livres, caso eles não compreendam o que estão fazendo ou jogando. É importante que eles não fiquem perdidos e confusos.


O flow praticamente resume o que eu tentei falar até agora. Um jogo diferente como o larp necessita não só de desafio e habilidade, mas tão de compreensão de funcionamento do jogo, proposta, e mecânicas caso existam. E uma pequena coisa que eu adicionaria para o jogo seria sintonia entre os jogadores. Caso eles estejam com percepções diferentes, o jogo pode ser tornar díspar e mais bagunçado.

E digo percepções exterioras à ficção do jogo. Percepções sobre a proposta do jogo, respeitá-la e jogar de acordo com ela.